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domingo, 29 de setembro de 2013

IMPORTÂNCIA DA POLÍTICA

FILOSOFIA – 3º ANO – PROFª ADALGISA
Importância da política
Como se sabe, 1964 é o ano do golpe militar no Brasil. Pela violência das armas e com o apoio de importantes setores da vida brasileira, entre eles a grande imprensa — principalmente do Rio de Janeiro e São Paulo —, parte da cúpula da Igreja e a classe média urbana conservadora, os militares tomaram o poder e fecharam o Congresso Nacional. Em 1984 ocorre o movimento das "Diretas-já". No ano seguinte, houve o encerramento do ciclo de governos militares cujo últi­mo representante, o general João Baptista Figueiredo, celebrizou-se por declara­ções excêntricas às quais, na época, a imprensa deu ampla repercussão.
A partir de 1984, a política entrou na ordem do dia, no noticiário da tevê, rádio e jornais, nas novelas, nas conversas de botequim, etc. Não que antes não se falasse dela, mas daí em diante virou mania nacional. O fato é que chegava ao fim o governo do general Figueiredo. A Constituição previa uma eleição indireta do presidente da República por um Colégio Eleitoral formado por congressistas. Cada vez mais, vários setores da sociedade clamavam por eleições diretas.
O deputado federal Dante de Oliveira fez um projeto de emenda constitucional propondo eleição direta à presidência da República já para a sucessão ao general Figueiredo. Foi a famosa iniciativa das "Diretas-já". Aos poucos, a ideia tomou conta da sociedade, não sem antes quebrar a resistência de grandes grupos económicos, sobretu­do na área das telecomunicações. Embora os meios de comunicação promovessem e dessem ressonância ao entusiasmo da sociedade com as "Diretas-já", a emenda foi derrotada no Congresso Nacional. Ela obteve a maioria de votos (298 contra 65, com 116 ausentes e 3 abstenções), mas não o número suficiente para perfazer dois terços dos votantes, quorum requerido pela Constituição para uma votação daquela natureza. Daí em diante foi uma "montanha-russa". Uma sucessão de clímax e anticlímax.
Primeiro veio a eleição de Tancredo Neves, um nome da oposição, no Colégio Eleitoral. Isso foi conseguido com uma cisão no partido do governo que levou para a oposição parte dos políticos que haviam participado do golpe e de seu recrudescimento entre 1964 e 1968. Foi uma congratulação total. O Brasil se redemocratizaria. Nascia a Nova República. Na véspera da posse, porém, Tancredo Neves foi hospitalizado e faleceu algumas semanas depois. Em meio à comoção nacional, o ataúde de Tancredo, coberto com a bandeira brasileira, foi acompa­nhado num cortejo poucas vezes visto no país: seguiu pelas ruas de São Paulo, depois por São João Del Rei, em Minas Gerais.
O vice-presidente José Sarney assumiu, então, a presidência da Repúbli­ca. Pode-se dizer que, mais do que senso de oportunidade, ele contou com o beneplácito dos deuses. Passou todo o período da ditadura no poder e, quando ela agonizava, reciclou-se. Pouco tempo depois, foi reentronizado, agora no centro do poder, como um artífice, baluarte, fiador da democracia. Ao final de seu governo, o país estava um caos. Nunca os políticos estiveram tão em baixa. Fez-se uma nova Constituição, sob a batuta do deputado Ulisses Guimarães. A marca do final do governo Sarney foi uma superinflação e um rosário de denún­cias de corrupção.
Eis que surge um "redentor da pátria". Jovem, viril, voluntarioso, prometia levar o povo brasileiro ao gozo total do desenvolvimento e da modernidade: o Primeiro Mundo. A designação "Primeiro Mundo" já havia sido usada antes, mas restrita ao campo da análise política ou geoeconômica. Indicava os países indus­trializados e com relativa estabilidade, principalmente da Europa ocidental e Amé­rica do Norte. Não tinha ainda a conotação de subserviência/superioridade que o jargão publicitário depois incorporou.
Fernando Collor de Mello ganhou a primeira eleição direta para presiden­te no país desde 1960. E sua queda foi tão vertiginosa quanto sua ascensão: aca­bou afastado pelo impeachment. Aí veio Itamar Franco. E o país ficou num estado de suspensão até a eleição de 1994.
Durante esse período que acabou de ser descrito, a política e os políticos foram da apoteose, da glorificação, à danação, à execração pública. Passaram a ser identificados como inimigos públicos e a política como a mais vil das atividades.
Pêlos idos de 1980, a palavra democracia era balbuciada suavemente. A política e a redemocratização estavam na ordem do dia. Rapidamente se chegou ao inverso. Houve um fastio, um enfado com a política e os políticos. E, embora se esteja falando do Brasil, é curioso notar que o mesmo fenómeno do desgaste e da rejeição correu e corre mundo afora. Basta acompanhar o noticiário inter­nacional para perceber como isso também acontece nos Estados Unidos, na Europa ocidental e no Japão, a grande potência econômica do Oriente.
O fastio é tanto que, nas eleições de 1994, a vedete foram os votos bran­cos, nulos e as abstenções, que patentearam a falta de entusiasmo e o descaso com a política. Nada daquele clima de festa cívica que as estações de televisão gostam de exaltar em dias de eleição. Em seu lugar, a apatia, o desinteresse.
Nasce, então, uma questão importante. Não há um só país no mundo em que não se faça política, onde não haja governo, presidentes, ministros, prínci­pes, reis ou deputados. Quer se dirija o olhar para países pobres, quer se obser­vem os países ricos, a política sempre está presente, e é fácil observar sua im­portância. Qual o motivo do descaso e da rejeição da política? Por que algo de que nenhum país pode prescindir aparece como coisa tão desprezível e desti­tuída de importância?
Entendendo o que são o poder e a política, obtêm-se subsídios para me­lhor julgar essa situação.
Eu sou eu e mais minha circunstância
É ainda uma ocasião para refletir sobre a interdependência entre o exercício da soberania do eu, do individual, e a necessidade física, social e psicológica de reconhecimen­to do tu; até porque esse tu só é um tu visto por mim, que sou um eu; mas visto de si mesmo ele não é um tu, é um eu. A dimensão da intersubjetividade e a dimensão do social são iniludíveis. Este é um dos elementos constitutivos do campo de significação da política.
Como se vê, o exame de uma situação corriqueira da vida cotidiana encer­ra questões teóricas cuja problematização não é menos necessária do que a reso­lução de problemas da vida prática. Mais que isso: nota-se que tais problemas têm resoluções que só aparentemente são simples e desligadas das influências teóricas ou abstratas. Na verdade, a resolução desses problemas inclui uma dimensão teórica e abstrata tão real e presente quanto suas dimensões práticas e concretas. O senso comum não costuma perceber isso.
Observemos um outro exemplo. Os prédios de apartamentos constituem uma engenhosa solução encontrada pêlos homens para a potencialização do uso do espaço nas cidades. Tomemos um prédio de dez andares com quatro aparta­mentos por andar como exemplo. Admitamos que em cada um deles more uma família. Cada família usa e dispõe do espaço interno de seu apartamento e gerên­cia esse uso interno de acordo com seus interesses, vontades, inclinações, etc. Mas o prédio não é composto somente pêlos espaços de uso particular. Há as áreas de circulação como escadas, elevadores, corredores, e áreas partilhadas por períodos mais longos como playgrounds, salas de reunião ou jogos, piscina, sauna, lavan­deria, etc.
Vê-se que a manutenção ou o trato dos apartamentos cabe a cada mora­dor, bem como o que acontece em seu interior, enquanto a manutenção e o trato dos espaços compartilhados por todos não cabe a nenhum morador em especial. Qualquer pessoa a quem se perguntasse a quem cabe o cuidado e a manutenção desses espaços responderia: "Ao condomínio!"
Ora, o morador de cada apartamento é concretamente identificável. É homem ou mulher, jovem ou idoso, médico ou publicitário, etc. Quando se diz morador, identifica-se a dimensão da vida que é particular e privada. Quando se diz condomínio, alude-se a uma entidade abstrata. Sabe-se quem é o morador do apartamento 102 ou do 204. Mas quem é ou o que é o condomínio? A resposta a essa questão é obtida quando se observa que cada pessoa não é somente mora­dor, ou seja, que a vida de cada pessoa não tem somente uma dimensão privada. Cada pessoa e cada morador vive a sua vida também na dimensão pública. E essa dimensão pública nasce exatamente da necessária sociabilidade dos homens.
Então, enquanto uma pessoa age no estrito âmbito do interesse particular, tem-se o morador. Enquanto age, ainda sob a responsabilidade particular, mas de tal modo que essa ação diz respeito à dimensão compartilhada e social da vida, deixa de ser apenas a pessoa morador, passando a ser também um condômino. 
Revendo as teorias políticas  
A palavra política tem sua origem na língua grega, mais precisamente no vocábulo polis, que compreende dois horizontes de significação. De um ponto de vista formal e institucional, ela indica um tipo de organização da população que existiu na Antiguidade clássica e que não se restringiu aos gregos, ostentando as seguintes características:
1) A tripartição do governo em uma ou mais assembleias, um ou mais conselhos, e certo número de magistrados escolhidos quase anualmente entre os homens elegíveis; 2) a participação direta dos cidadãos no processo político: a noção de cidade-estado implica a existência de decisões coletivas, votadas depois de discussão (nos conselhos e/ ou nas assembleias), que eram obrigatórias para toda comunidade, o que quer dizer que os cidadãos com plenos direitos eram soberanos; 3) a inexistência de uma separação absoluta entre órgãos de governo e de justiça, e o fato de que a religião e os sacerdócios integravam o aparelho de Estado (Cardoso, 1990: 7).
De um ponto de vista semântico ou interpretativo, polis quer dizer "cida­de". Não na acepção apenas física ou topográfica, mas incluindo também aquele espaço público, o espaço da intersecção da vida dos indivíduos numa comunida­de, num coletivo.
Dessa forma, o núcleo de significação da palavra política vem, principal­mente, da Antiguidade grega e nela encontra-se o atestado de nascimento ou a carteira de identidade da política, isto é, da arte política. E isso fica claramente indicado quando se ajusta o olhar histórico.
Platão: a política com arte
Platão, com quem a filosofia ganha status definitivo de saber articulado e fundado, produz uma obra cujo título é A República. Nessa obra, a política é caracterizada como a arte de definir e praticar a administração da justiça. Mas esta só pode ser definida desde que se ultrapasse o âmbito da mera opinião.
Ela não é algo que assuma uma forma aqui e outra acolá. Ela pertence à ordem de um saber universal, à ordem da perenidade do ser. E, como o conheci­mento dessa ordem universal é próprio da filosofia, só o filósofo pode e deve governar. Platão passa à história como aquele que tenta ultrapassar o jogo das opiniões. Mostra que a atividade de governar, isto é, a atividade de cuidar das coisas da cidade não pode e não deve ser regulada pelas conveniências, posto que esse caminho levará ao exercício do poder baseado na força e tal recurso é ineficaz para realizar o bem da cidade.
O essencial aqui é perceber a importância das especulações dos gregos do século V a.C. e, em particular, observar que, com Platão, a política, isto é, o trato das coisas da cidade, não pode ficar na dependência da opinião, e que, se isso ocorre, descamba-se fatalmente para a violência e o emprego da força bruta. Os dois são ineficazes para salvaguardar o bem da cidade.
Não cabe aqui um julgamento da teoria filosófica e política do platonismo. Até porque isso demanda um estudo amplo e rigoroso. O que se pode ver é o nascimento da política enquanto arte e atividade absolutamente indispensáveis à sobrevivência da sociedade e, além disso, a inseparabilidade entre a ideia de governo e a ideia de razão.
Aristóteles: as formas do poder
•'              Outro "momento" importante para se ampliar a compreensão das ques­
tões relativas à política está na obra de Aristóteles. Aliás, o termo política tem seu
uso generalizado por influência de uma obra de Aristóteles intitulada Política.
Nela, o autor estabelece, entre outras coisas, duas referências importantes.
A primeira é a tipificação das formas de poder: o poder paterno, o despó­tico e o político. O poder paterno se exerce no interesse dos filhos; o despótico, no interesse do senhor; e o político, no interesse de quem governa ou de quem é governado. A segunda diz respeito às formas de governo: a monarquia (poder de um só); a oligarquia (poder de poucos); e a democracia (poder da maioria).
Aristóteles recomenda as formas de governo que misturam os vários tipos existentes. Para ele, o homem é, por natureza, um animal social e político. Assim, vive em sociedade e forma uma comunidade política. Também é da natureza humana buscar a felicidade e o sumo bem. Portanto, a felicidade e o sumo bem só poderão ser alcançados na vida da polis. A sociedade política ganha a dignidade de uma obra da razão e é uma das mais altas e nobres criações humanas.
O desejo dos camponeses, os interesses dos mercadores, as necessidades dos artesãos, tinham fornecido o quadro para o surgimento de um Estado centra­lizado e forte, em substituição ao emaranhado confuso de um período em que a soberania estava pulverizada entre senhores com terras — e, portanto, riqueza —, suficientes para juntar exércitos, erguer fortificações e oferecer àqueles que os homenageavam uma vida segura dentro de um feudo.
Mas esse Estado cresceu demais, e não apenas passou a rivalizar com o poder papal, como também se transformou em entrave para a burguesia, que cresceu à sua sombra. Passou, então, a ser acossado tanto por essa burguesia quanto por uma massa de camponeses que, embora tivessem conquistado o direi­to de produzir, eram massacrados por impostos para sustentar a vida suntuosa dos nobres da corte e dos clérigos.

 LIVRO: Um Outro Olhar, Souza, Sonia Maria Ribeiro de, Ed. FTD

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